segunda-feira, março 28, 2005
"Os meus olhos são uns olhos...
... E é com esses olhos uns
que eu vejo no mundo escolhos
onde outros, com outros olhos,
não vêem escolhos nenhuns.
Quem diz escolhos diz flores.
De tudo o mesmo se diz.
Onde uns vêem luto e dores
uns outros descobrem cores
do mais formoso matiz.
Nas ruas ou nas estradas
onde passa tanta gente,
uns vêem pedras pisadas,
mas outros, gnomos e fadas
num halo resplandecente.
Inútil seguir vizinhos,
querer ser depois ou ser antes.
Cada um é seus caminhos.
Onde Sancho vê moinhos
D. Quixote vê gigantes.
Vê moinhos? São moinhos.
Vê gigantes? São gigantes."
Impressão digital
António Gedeão
terça-feira, março 01, 2005
quem sou eu
se não tenho olhos e os meus lábios pararam? se não te posso sussurrar que te amo ou te detesto ou que não és nada para mim? quem sou eu se me fecho em vez de te tocar?... é isso, ninguém. fico cinzenta de esperar pelas palavras que não ouço. e não vejo, porque também não há coisas para ver. nem preta nem branca, mantenho a mente tão cinza como aquela cinza que vou ser um dia quando cair à relva ou à água, depois de ser mais fogo. um dia vou ser uma luz que voa na terra do nada, onde, como não há nada, a solidão não existe. mas entretanto preciso de me tapar porque a temperatura está negativa e eu congelei os dedos por tocar o ar a ver se te encontrava... como não te vi, também congelei o resto do corpo e, na verdade, sou a estátua que vês, imóvel, desviva, feita fóssil para colecção. que é o mundo mais que uma colecção de corpos?...
...um beijo colar-te-ia, sem me derreter. já não conseguirias chegar aqui, o caminho enrolou-se assim de repente, deu um nó e deixou de existir.
toma, é para ti...
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