terça-feira, janeiro 29, 2008

quarta-feira, janeiro 23, 2008

ternurenhice

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pausa (de semínima)
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e antes de despedir, um momento de ternura para concretizar um dos princípios proposto no grupo de crianças: nunca se recusa um abraço.

vem logo Sérgio Godinho à cabeça


são dois braços
são dois braços
servem p'ra dar um abraço

assim como quatro braços
servem p'ra dar dois abraços

e assim por aí fora
até que quando for a hora
vão ser tantos os abraços
que não vão chegar os braços
para os abraços

terça-feira, janeiro 15, 2008

a duas senhoras

porque...



uma nasceu no meu dia de anos, ainda que quase 100 anos antes, e escreveu

Nenhum olhar, fosse de um ser humano, de uma fera enjaulada ou de um animal de estimação, havia contemplado Mrs. Lanier quando ela não estava melancólica. Ela dedicava-se à melancolia, como os artistas menores às palavras e à tinta e ao mármore.

(no Coração de Manteiga, um dos seus contos)









a outra faleceu no ano em que nasci, e se tal não tivesse acontecido, teria completado no outro dia 100 anos. para além disso, disse

Que nada nos limite. Que nada nos defina. Que nada nos sujeite. Que a liberdade seja a nossa própria substância.
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(penso que o disse no Segundo Sexo)

quinta-feira, janeiro 03, 2008

começo o ano com um adeus

*

Nos teus olhos altamente perigosos
vigora ainda o mais rigoroso amor
a luz dos ombros pura e a sombra
duma angústia já purificada

Não tu não podias ficar presa comigo
à roda em que apodreço
apodrecemos
a esta pata ensanguentada que vacila
quase medita
e avança mugindo pelo túnel
de uma velha dor

Não podias ficar nesta cadeira
onde passo o dia burocrático
o dia-a-dia da miséria
que sobe aos olhos vem às mãos
aos sorrisos
ao amor mal soletrado
à estupidez ao desespero sem boca
ao medo perfilado
à alegria sonâmbula à vírgula maníaca
do modo funcionário de viver

Não podias ficar nesta casa comigo
em trânsito mortal até ao dia sórdido
canino
policial
até ao dia que não vem da promessa
puríssima da madrugada
mas da miséria de uma noite gerada
por um dia igual

Não podias ficar presa comigo
à pequena dor que cada um de nós
traz docemente pela mão
a esta pequena dor à portuguesa
tão mansa quase vegetal

Mas tu não mereces esta cidade não mereces
esta roda de náusea em que giramos
até à idiotia
esta pequena morte
e o seu minucioso e porco ritual
esta nossa razão absurda de ser

Não tu és da cidade aventureira
da cidade onde o amor encontra as suas ruas
e o cemitério ardente
da sua morte
tu és da cidade onde vives por um fio
de puro acaso
onde morres ou vives não de asfixia
mas às mãos de uma aventura de um comércio puro
sem a moeda falsa do bem e do mal

*

Nesta curva tão terna e lancinante
que vai ser que já é o teu desaparecimento
digo-te adeus
e como um adolescente
tropeço de ternura
por ti



Um adeus português,
Alexandre O'Neill
*