não consigo evitar ficar perplexa com o que tenho lido. falo nomeadamente no âmbito da violência e respostas possíveis para potenciar um contexto oposto – inocentemente, por vezes, denominado Paz.
era uma vez um metro do Porto. em plena hora de ponta, como se pode esperar, o metro encontra-se cheio. há, no entanto, quem se afaste de “potenciais focos de problemas”. falo de um pequeno grupo de rapazes, entre os 10 e os 13 anos, com expressões “assustadoras” para os restantes transeuntes. ao verem que alguém escrevia qualquer coisa no telemóvel, começaram a representar um possível assalto subsequente, com instruções explícitas: “e é quando ela acaba de escrever que um de nós estica o braço e…”, e, nesse momento, parou de escrever e tirou o dito acessório tecnológico do alcance deles. ao que se seguiu um monólogo triste: sem subir o tom de voz, e perante a apatia de quem seguia no mesmo metro, indagou os rapazes sobre a justiça de tal acto, o conhecimento que tinham sobre o processo de cada um para ter o que tem, o que será preciso para sobreviver – medo ou acção? – etc. até ao ponto em que incorreu na mágoa mais profunda de lhes dizer: “o que vocês precisam é de mimo”. e um olhar muito triste focou o mesmo chão de todos nós. “desculpe, menina, você é bonita. desculpe. até à próxima.”
era uma vez um bairro social com forte percentagem de residência de emigrantes. por diversas vozes considerado das áreas de maior incidência criminal e violência da cidade. um dos problemas efectivos era a comunicação: eram poucos os que falavam a mesma língua. um dia, a caminho do estágio, perdi-me, portuense em Bologna. perguntei ao primeiro rapaz que encontrei uma saída possível; só percebi “Rússia”, ainda não tinha aprendido a falar, mas pegou no meu braço e levou-me até à paragem de um autocarro que me conduziria ao centro. pouco tempo depois perdi-me na periferia oposta, onde só havia caravanas das comunidades Rom nómadas. uma menina reconheceu-me, por me ter visto a entrar no Jardim-de-Infância, apresentou-me a família e continuou a brincar no jardim em que vivia. apontou o caminho de saída e mandou um beijo ao ar. etc, etc.
eram muitas vezes muitas pessoas com medo de respirar. por terem receio de construir alguma solução colectiva, de procurar respostas humanamente comunitárias, deixam-se cair na apatia individualista e egoísta. apostam no fitness enquanto paz de corpo e no vazio constante enquanto paz de espírito. se calhar, nunca pensaram num conceito de Paz dinâmica. aquela que implica acção, disponibilidade, intencionalidade, aquela que não é a ausência da revolta mas a forma privilegiada de luta. aquela que exige crítica para ser compreendida e desenvolvida.
que cansaço de apáticos conformistas. que medo de ser assim quando, de tão cansada, não acreditar de todo que é possível mudar alguma coisa.